É muito estranho (na verdade eu acho muito
engraçado) você viver em um lugar onde não é falada sua língua materna. Há
situações em que você quer dizer alguma coisa, mas não consegue, pois você não
sabe falar o que quer. E agora eu descobri como me sinto em relação a isso: Eu
sou como uma criança. Sabe quando a criança está aprendendo a falar? Pois é
exatamente assim que me sinto.
Às vezes, acontece alguma coisa inesperada,
tipo ontem indo para o jogo do Lyon. Um senhor esbarrou em mim e pediu
desculpas. Eu queria dizer: “Não foi nada.” Sabe o que saiu? “Hum, hã, ah,
uh,,,”, ou seja, só grunhidos que não significaram absolutamente nada! Mas o
cara entendeu. Isso é fantástico! É como quando a gente ouve a criança e não
entende nada do que ela falou, mas sabe o que ela quis dizer.
Agora a parte mais divertida é precisar mesmo
falar com alguém em francês. Isso tem acontecido muito pouco porque no IARC a
gente praticamente só fala em inglês. No nosso grupo quase ninguém fala francês,
pois, além de mim e da Su, temos uma alemã, um austríaco, uma eslovaca, uma coreana, uma
filipina, e por aí vai. Mas temos um colega que é francês que prometeu que vai
nos ensinar o idioma. Semana que vem começaremos as aulas de francês, aqui
mesmo no IARC. Mas voltando às minhas aventuras no idioma...
Fui em uma loja de cosméticos, pois eu queria
comprar um creme hidratante (aqui o clima é muito seco e com a água “dura” a
nossa pele fica mesmo muito mal). Pois bem, entrei na loja e já me perdi na
quantidade GIGANTE de marcas e tipos diferentes de cremes que tinha. Então,
depois de eu dar uma volta olímpica na loja, vem a vendedora: “Posso ajudar?”.
Eu já quis dizer “Tô só olhando” e desistir. Bom, primeiro que eu já não sabia
como dizer isso e quase saiu um “ah, hã, hummm”... mas respirei fundo e decidi
enfrentar o bicho. Não sei como, mas consegui dizer que queria o tal creme.
Saiu algo como “Eu ter pele seca. Eu precisar creme.”. Ufa! Ufa, que nada! A
mulher me entendeu e começou a fazer vááárias perguntas, tipo “Qual teu tipo de
pele?” “Que marca prefere?”, “Gosta de creme mais ou menos oleoso?”. Ai, ai,
ai... me ralei. E responder tudo isso? A índia velha aqui começou a responder
no seu parco francês. Mas é bem como a minha professora de francês de POA
dizia, eu sou beeem comunicativa. Acho que consegui responder todas as
perguntas, pois saí de lá com um creme na sacola e completamente suada de tanto
nervoso. E sabem que o creme é bem bom? E tinha um preço legal também. Mas a
parte mais engraçada foi quando perguntei sobre a épilation. Eu queria comprar cera, na verdade. Mas a vendedora
começou a falar que lá tem um Institut de
beauté e que eles fazem épilation.
Ok, vamos tentar falar em francês de novo: “Você quer depilar o quê?” Aí eu
queria dizer “as pernas” e só vinha jambon
na minha cabeça. Jambon é presunto!
Mas eu não falei, pois senti que tinha alguma coisa errada. Mostrei as pernas e
a mulher: “jambes?”, “Ouiiiii...”. A
virilha eu já sabia que era maillot,
e a mulher pergunta: “Que tipo?”. Ai, ai... situação perigosa! Penso: Como será
cavada em francês? Mas a mulher complementa: “Quer tirar tudo?”, “Oh, nonnnnnn!!!!”
Mas eu descobri mesmo que sou como uma criança
quando fomos encomendar as placas que devem ficar na caixa do correio e na
porta do apartamento. Abre parênteses:
Isso é outra coisa que é bem diferente do Brasil. Nos prédios daqui tudo que é
seu é identificado com seu nome. Não se usa número de apartamento, o que deixa
tudo mais complicado, no meu ponto de vista. Primeiro que quando a gente diz o
endereço pra alguém, só identifica o andar do apê. Então a gente precisa
colocar nome (prénom) na caixa do
correio, quer dizer, na verdade se coloca o sobrenome (nom), colocar o nome na porta do apartamento e colocar o nome no
interfone. Pode uma coisa dessas? Aí, cada vez que alguém se muda, tudo tem que
ser trocado. Mas, no nosso caso, resolvemos não mudar o nome no interfone. Como
é um interfone chique, do tipo que tem os nomes armazenados eletronicamente,
tem que pagar pra trocar. Ah, não, né? Custa 20 euros!! Então pra interfonar a
gente tem que procurar “Dos Santos”. Que tal? É o nome do dono do apê... Tudo
bem porque a Su tem familiares que são Dos Santos, então agora ela assumiu esse
lado da família. Fecha parênteses. Bom,
achamos uma loja aqui do lado do IARC (ao lado do IARC tem tudo!) que faz as
tais placas. Então fomos encomendar: “queremos uma placa para a caixa do
correio”. A Su falando em francês. Aí o cara dispara: “Quais as medidas?”,
“Qual a cor?”, “Qual o material?”. Vem meu lado criança: quero aprender tudo!
Como se fala “prata” em francês? “Silver”? Hahaha... não é. É d’argent. Nem a cor eu sabia falar. Sim,
tudo é complicado e vira uma novela. Complicado porque é novidade pra gente. Bom,
resumindo a tal novela: tivemos que ir 3 vezes na loja. Depois da primeira ida,
peguei as medidas e fomos felizes lá. Aí o cara: “Qual o material”? Respondemos
“metal”. E o cara “Que tipo?”. Ai, como assim? Tem vários tipos de metal... e
temos que seguir o padrão do prédio. Ok, voltamos pra casa e fiquei bisbilhotando
as caixas e portas dos vizinhos. Na 3ª visita conseguimos encomendar as tais
placas e aí perguntamos “quanto custa?”. O cara responde: “Oh, a pessoa que faz
o orçamento não está, mas fazemos na confiança de que vcs vêm pegar as placas”.
OK... Agora quero ver quanto vai sair a brincadeira.
O dia-a-dia também pode ser beeeeeeem diver!